A vida de um refugiado africano durante "Uma Temporada na França"

De forma simples e comovente, filme traz temática atual e polêmica para às telas do cinema

O diretor africano Mahamat-Saleh Haroun, nasceu no Chade e estudou cinema e jornalismo em Paris e Bordeaux. Desde o seu primeiro filme, o documentário “Bye Bye Africa” (idem, 1999), ele vem conquistando prêmios em importantes festivais pelo mundo, sendo inclusive, já ter sido membro do Júri Oficial no Festival de Cannes em 2011.


“Uma Temporada na França” (Une saison en France, 2017) é o seu oitavo longa-metragem e aborda a delicada e complexa questão dos refugiados na Europa, mais especificamente, na França. Abbas Mahadjir, interpretado por Eriq Ebouaney, é um pai viúvo com dois filhos tentando sobreviver em Paris após sair fugido de Bangui, capital da República Centro-Africana (RCA). A esposa morreu durante a fuga, já que o país vive uma brutal e violenta guerra religiosa desde 2012.

Para vias de contextualização e melhor compreensão, o conflito vivido na RCA é entre muçulmanos e católicos, e como se não bastasse, a ONU recebeu denúncias alarmantes sobre esdrúxulos e cruéis casos de abusos de exploração sexual de meninas nativas do país. Abusos esses praticados por militares franceses entre 2013 e 2014. No entanto, todas as denúncias foram arquivadas, visto que, segundo a justiça da França, não foi possível demonstrar a implicação desses militares.


 
O diretor opta por não mencionar nada a respeito do que acontece no país de origem do protagonista e foca somente nas dificuldades vividas por um homem refugiado. Além dele, há também o “Tio Etienne”, como é chamado pelos filhos de Mahadjir, que é interpretado pelo cantor Bibi Tanga, sendo ele o único dos atores realmente nascido na RCA. A situação de Mahadjir, inicialmente, se apresenta de maneira tranquila. Ele mora em um belo apartamento com sua filha Asma e seu filho Yacine. Trabalha carregando caixas e vendendo verduras em uma feira. É na feira que conhece Carole (Sandrine Bonnaire), com quem mantém um relacionamento amoroso. Tudo parece relativamente bem em sua vida, até ele receber uma correspondência, notificando-o para comparecer no Tribunal de Asilo para Refugiados. A partir daí a situação se complica, pois, seu nome não sai na lista dos agraciados com asilo pelo governo francês, logo, sua permanência se torna ilegal.

Já Etienne, também tem uma namorada, porém percebemos que ele não conta nada para ela a respeito da sua real condição. Ele vive em um barraco improvisado e trabalha de segurança na porta de uma farmácia. Tanto Mahadjir quanto Etienne eram professores em seu país de origem. Mas, tiveram que largar tudo para conseguirem sobreviver à guerra e, agora, travam uma nova batalha burocrática para poderem ficar em um lugar sem serem perseguidos ou deportados.


Mahadjir tem que sair do apartamento onde mora, pois o dono que lhe emprestou por um período temporário, irá retornar. É demitido do seu trabalho e se muda para uma quitinete com os dois filhos. Como não tem como pagar, acaba sendo expulso. Carole, então, os abriga em seu pequeno apartamento. É interessante observar, que apesar de tantos problemas, Mahadjir consegue ser um personagem leve, extremamente carinhoso com os filhos e a namorada. O mesmo não pode ser dito de Etienne, que após ter o seu barraco destruído, resolve maximizar ainda mais o seu orgulho, ao ponto de ser levado a cometer um ato de fúria que não acaba bem.

Analisar a complexa condição dos refugiados é uma reflexão que se faz necessária, e precisa ser feita de uma maneira extremamente cuidadosa por parte dos países que recebem (ou não) essas pessoas. No caso, dos refugiados africanos, podemos dizer que a Europa lhes deve uma atenção ainda maior, pois foi justamente durante uma conferência, em 1885, conhecida como “Conferência de Berlim” onde diversos países europeus proclamaram e dividiram a “África”, sem respeitar suas diferenças culturais e religiosas, de acordo com seus interesses econômicos. E agora são os europeus que se sentem explorados por aqueles que sempre exploraram. A atitude de Mahadjir no final do filme talvez demonstre, provavelmente, conforme o desejo dos governos da Europa qual seria a melhor solução para tratar essa questão: Que todos os refugiados simplesmente desaparecessem!


FICHA TÉCNICA:
Direção e Roteiro: Mahamat-Saleh Haroun
Elenco: Eriq Ebouaney, Sandrine Bonnaire, Bibi Tanga
Produção: Florence Stern
Fotografia: Mathieu Giombini
Distribuidora: Imovision
Duração: 90 min
Ano: 2017

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