Linha de Passe (2008)


Dizem que uma das características dos bons diretores de cinema é que eles sempre fazem os mesmos filmes, ou seja, abordam sempre os mesmos temas. O espanhol Pedro Almodóvar adora mergulhar no universo feminino, o, também espanhol, Luis Buñuel gostava de criticar a sociedade burguesa, e já o sueco Ingmar Bergman se aprofundou na complexidade do próprio ser humano. O diretor brasileiro Walter Salles traz, como um tema latente para as telas, a questão do abandono. Em Terra Estrangeira (1995), vemos a história de alguns brasileiros que abandonaram o país, em busca de uma vida melhor, em plena crise do governo Collor. Em Central do Brasil (1998), o menino Josué, que estava em busca do pai, se encontra ainda mais abandonado após a morte da mãe. Abril Despedaçado (2001), que considero sua maior obra-prima, o personagem de Rodrigo Santoro tem o desejo de abandonar a vida que leva. Até mesmo a refilmagem do original japonês, Água Negra (Dark Water, 2005), feita nos EUA, também vemos uma mulher que vive com um trauma de ter sido abandonada pela mãe. Enfim, nos outros filmes dirigidos por Walter o mesmo tema se repete.



Em Linha de Passe (2008), nos deparamos com uma família simples vivendo na cidade de São Paulo. Cleusa é mãe de quatro filhos homens e está grávida de mais um. Os três irmãos mais velhos são frutos do mesmo pai, porém o mais novo é de um outro relacionamento. E de todos, é ele quem se sente mais abandonado pelo pai ausente. Não ficamos sabendo o que aconteceu com esses homens. Se morreram, ou se simplesmente foram embora. O foco está centrado na Cleusa. Ela é quem é a figura forte e importante desse núcleo familiar. A história de cada um deles nos é mostrada de forma equilibrada e muito bem costurada. Denis, o irmão mais velho, é motoboy. Dinho se converteu a igreja evangélica e trabalha num posto de gasolina. Dario sonha em ser jogador de futebol. E Reginaldo, o mais novo, tenta descobrir quem é seu pai.


Nesse filme, o tema pertinente de Walter, que é o abandono, não está no núcleo da família em si. Pelo contrário, a mãe Cleusa faz com que seus filhos não se sintam assim. Eles sabem que ela estará sempre presente. Porém, o sentimento de abandono está em relação ao contexto sócio-econômico como um todo. Assim como essa família, outras também estão esquecidas e vivem à margem, não só da sociedade, mas também à margem de suas questões pessoais, éticas e de caráter. As pessoas estão por aí, espalhadas nas cidades, tentando sobreviver, e viver, dentro do possível. Estão passando a bola uma para outra, às vezes tem aquele que é fominha e que não quer passar logo, ou quando joga, ela vai muito longe, e parece que não se vai conseguir pegá-la, mas o esforço se faz presente e ela é alcançada, fazendo assim com que não caia. Enfim, o importante é continuar tentando e sair ileso da Linha de Passe.

Comentários

Amália Queiroz disse…
Larissa,
Ainda não ví o filme, mas apenas sua descrição sobre Linha de Passe, já me fez imaginar as cenas.
Eu não havia percebido nos filmes do Walter Salles essa constante do abandono.
Acho que a grande criatividade está aí. MOstrar uma mesma temática, porém com focos diferentes.
MUITO BOM!
Adorei o que lí!
Bjs,
Maria Amália Queiroz Bello
Vila Velha /ES
Monique Andrad disse…
Encontrei o seu blog por acaso e gostei muito. É bem trabalhado e você faz boas análises sobre os filmes. Eventualmente, também, ponho críticas minhas sobre filmes no blog que criei: www.jornalistadeopiniao.blogspot.com
Se puder dar uma olhada depois gostaria de uma opinião sua sobre elas, apesar de no momento estar mais voltada para a realidade da minha faculdade (Uerj), adoro cinema!
Beijos!